O significado de "Igreja Católica" nos Pais da Igreja
Muitos blogs católicos administrados por pseudo-apologistas inexperientes propagam aos montões certas citações dos Pais da Igreja, onde eles mencionavam o nome de “Igreja Católica”, como se isso significasse exatamente a aprovação de todos os dogmas e todas as doutrinas falsas que a Igreja Romana possui nos dias de hoje. Nada mais longe da verdade. O texto mais utilizado por eles é esse de Inácio de Antioquia (35 – 107), que diz:
"Onde está Cristo Jesus, está a Igreja Católica" (Inácio aos Erminiotas, 8:2)
Existem várias outras citações do tipo, presentes nos escritos da maioria dos Pais da Igreja, como em Agostinho, Cipriano, Jerônimo, Tertuliano e vários outros. Porém, vamos trabalhar mais neste texto de Inácio, que diz basicamente o mesmo que os demais. Em primeiro lugar, cabe ressaltar aqui que apenas debatedores amadores que lançam mão de um argumento deste nível.
Os mais sérios jamais alegaram que por “Igreja Católica” signifique “Igreja Romana” (atual), pois “católica” significa simplesmente “universal”. Assim, a Igreja Cristã ganhou este termo apenas para representar a universalidade da Igreja, e não uma instituição particular centralizada em Roma ou em qualquer outro lugar. Só isso já seria o suficiente para refutarmos os tais argumentos amadores de “apologistas” principiantes.
Mas vamos um pouco mais além. Na menção acima, de Inácio, vemos o nome de “Igreja Católica”, mas não de “Igreja Romana”. Os romanistas argumentam dizendo que a “Igreja Católica” era na época a mesma coisa que “Igreja Romana” é hoje. Este argumento é absolutamente falho pela simples razão de que os Pais da Igreja citavam inúmeras vezes “Igreja Católica”, mas nunca “Igreja Católica Romana”! Como é que eles iriam se esquecer sempre do “principal”?
Além disso, o próprio Inácio de Antioquia escreve dizendo que a Igreja não foi fundada em Roma, mas em Antioquia:
“Devemos, portanto, provar a nós mesmos que merecemos o nome que recebemos (=cristãos). Quem é chamado por outro nome além deste não é de Deus, pois não recebeu a profecia que nos fala a respeito disso: ‘O povo será chamado por um novo nome, pelo qual o Senhor os chamará, e serão um povo santo’. Isto se cumpriu primeiramente na Síria, pois ‘os discípulos eram chamados de cristãos na Antioquia’, quando Paulo e Pedro estabeleciam as fundações da Igreja. Abandonai, pois, a maldade, o passado, as influências viciadas e sereis transformados no novo instrumento da graça. Permanecei em Cristo e o estranho não obterá o domínio sobre vós” (Inácio aos Magnésios, Versão Longa, Cap.10)
Inácio não fala nada sobre a Igreja ser “Romana”, e, como se isso não fosse suficiente, ele afirma positivamente que o local onde a Palavra do Senhor primeiramente se cumpriu não foi em Roma, mas na Síria, e, em seguida, declara que foi em Antioquia que os discípulos foram pela primeira vez chamados cristãos (At.11:26), e que lá Paulo e Pedro estabeleceram as fundações da Igreja.
Em outras palavras, na visão do próprio Inácio (que é tão citado pelos apologistas católicos) a Igreja foi fundada em Antioquia, no Oriente, e não em Roma, no Ocidente! Tendo em vista isso, é muito irônico os católicos fazerem uso dos escritos de Inácio para dar uma aparência de seriedade às suas teses.
Inácio serviria muito mais para fortalecer as Igrejas Católicas Ortodoxas do que a Igreja Romana, visto que dizia que a Igreja foi fundada no Oriente, não em Roma. Então, Inácio não tinha qualquer visão de uma Igreja “Católica Romana”, tornando em vão as tentativas de colocar Inácio a favor de uma Igreja Católica Romana.
A Igreja Ortodoxa Grega também clama ser católica, também arroga para si uma sucessão apostólica que é confirmada pela lista dos primeiros Pais da Igreja, também alega possuir uma tradição apostólica; porém, possui muitos dogmas e doutrinas absolutamente distintos da Igreja Romana (os quais você pode conferir clicando aqui).
Se o argumento do nome “católica” ser usado pelos Pais da Igreja significa legitimidade de todas as igrejas que arrogam para si mesmas este nome e que possuem uma sucessão apostólica, então deveríamos determinar como verdadeiras todas as igrejas católicas do Oriente, que tem dogmas e doutrinas muito, muito distantes de Roma, que não admitem a imaculada conceição de Maria, a infalibilidade papal, a primazia do bispo romano, o purgatório, o limbo, as imagens de escultura e muitas outras coisas do tipo.
Portanto, este argumento da Igreja ser chamada de “católica” não serve para absolutamente nada. Para o lixo essa interpretação.
Além disso, a Igreja Ortodoxa Síriaca de Antioquia afirma, assim como a Igreja Romana, ser descendente de Pedro por sucessão apostólica. De fato, segundo a tradição de alguns Pais, Pedro teria sido bispo de Antioquia antes de “fundar” a Igreja de Roma. Porém, ambas as “igrejas católicas” que são “descendentes de Pedro” possuem doutrinas inteiramente distintas e mutuamente excludentes entre si.
Existe até mesmo a “Velha Igreja Católica”, que se formou após um cisma por causa da promulgação do dogma da infalibilidade papal (1870), que jamais havia sido reconhecido para uma igreja particular, como a romana. Consequentemente, os “velhos católicos”, que também dizem guardar a “verdadeira doutrina católica”, também não aceitam a assunção de Maria, que foi definida como dogma em 1950 através da infalibilidade papal.
Tendo em vista tudo isso, se apropriar do termo “católica” para justificar uma igreja em particular (seja a romana ou qualquer outra), ou ostentar um título de “bispo universal” é uma prepotência injustificada, que foi negada com veemência pelo próprio Gregório Magno, que foi bispo da Igreja de Roma (chamado “papa” pelos católicos) entre os anos 590-604, como sendo um «precursor do anticristo», que «exalta-se acima de todos os outros sacerdotes», sendo «levado pelo orgulho» por ostentar este «título soberbo»:
“Agora eu digo com confiança que todo aquele que chama a si mesmo, ou deseja ser chamado, Sacerdote Universal, é em sua exaltação o precursor do Anticristo, porque ele orgulhosamente se coloca acima de todos. E pelo orgulho ele é levado ao erro, pois como perverso deseja aparecer acima de todos os homens. Por isso, todo aquele que ambiciona ser chamado único sacerdote,exalta-se acima de todos os outros sacerdotes” (Papa Gregório Magno, a Maurícius Augustus)
“Que dirás tu João a Cristo que é cabeça da Igreja universal no prestar de contas no dia do juízo final? Tu que te esforças de te antepor a todos os teus irmãos bispos da Igreja universal e que com um título soberbo queres pôr debaixo dos teus pés o seu nome em comparação do teu? Que vais tu fazendo com isso, senão repetir com Satanás: Subirei ao céu e exaltarei o meu trono acima dos astros do céu de Deus? Vossa fraternidade quando despreza (os outros bispos) e faz todos os esforços possíveis para os subjugar, não faz senão repetir quanto já disse o velho inimigo: Me exaltarei acima das nuvens mais excelsas (...) Possa pois tua Santidade reconhecer quanto é grande o teu orgulho pretendendo um título que nenhum outro homem verdadeiramente pio jamais se arrogou” (Papa Gregório Magno, Epistolarum V, Ep. 18, PL 77, pag. 739-740)
“Vossa Bem-aventurança também foi cuidadoso em declarar que não faz agora uso de títulos orgulhosos, que brotam de uma raiz de vaidade, ao escrever a certas pessoas, e se dirige a mim dizendo, «Como tu o ordenaste». Esta palavra, ordenar, lhe rogo que a afaste dos meus ouvidos, já que sei quem sou eu e quem sois vós. Pois em posição sois meus irmãos, em caráter meus pais. Eu não ordenei, então, mas estava desejoso de indicar o que me parecia ser benéfico. Contudo, não acho que Vossa Bem-aventurança tenha estado disposto a recordar perfeitamente esta mesmíssima coisa que trago à sua memória. Pois eu disse que nem a mim nem a mais ninguém devia escrever alguma coisa do gênero; e eis que no prefácio da epístola que me dirigiu a mim que me recuso a aceitá-lo, considerou apropriado fazer uso de um apelido orgulhoso, chamando-me Papa Universal. Mas rogo à sua dulcíssima Santidade que não volte a fazer tal coisa, já que o que é concedido a outro para lá do que a razão exige é subtraído de você mesmo. Pois, quanto a mim, não busco ser prosperado por palavras, mas pela minha conduta. Nem considero uma honra aquilo pelo qual sei que meus irmãos perdem a honra deles. Pois a minha honra é a honra da Igreja universal; a minha honra é o sólido vigor dos meus irmãos. Então sou verdadeiramente honrado quando não é negada a eles a honra devida a todos e cada um. Pois se Vossa Santidade me chama a mim Papa Universal, nega que seja você o que me chama a mim universalmente. Mas longe esteja isto de nós. Fora com as palavras que inflam a vaidade e ferem a caridade” (Papa Gregório Magno, Epístola 8.30, a Eulógio, bispo de Alexandria)
Portanto, vemos que não existia um «bispo universal», muito menos o de Roma. Ninguém pode se apropriar com exclusividade do termo «católica», seja por sucessão apostólica ou por se considerar acima dos demais. Sendo assim, os verdadeiros guardadores da universalidade (catolicidade) da Igreja são aqueles que genuinamente guardam a doutrina apostólica da Igreja, legada a nós através das Escrituras Sagradas.
E, por esta mesma razão, não podemos considerar os católicos romanos como legítimos cristãos “católicos” no sentido real da palavra, pois fazem parte de uma Igreja que já caiu na apostasia há muito tempo, ostentando para si mesma títulos de soberba, como «bispo universal», «Igreja mãe» ou «única Igreja de Cristo», promulgando dogmas que jamais foram vistos na história da Igreja, mas que são puramente acréscimos que desviam da verdadeira doutrina apostólica que nos é encontrada nas Escrituras Sagradas.
A apostolicidade e a ortodoxia de uma Igreja mede-se pela correspondência da sua doutrina com a doutrina pregada pelos apóstolos de Jesus Cristo conforme esta se encontra registrada no Novo Testamento, e não pelo número de anos que possa ter, por uma suposta sucessão apostólica, primazia universal ou tão meramente pelo termo “católica”.
Então não, a Igreja «Católica» não era a Romana. Não passa de uma pegadinha para enganar os mais incautos, que não tem capacidade de discernimento.
Paz a todos vocês que estão em Cristo.
Por Cristo e por Seu Reino,
Lucas Banzoli (apologiacrista.com)
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jesus morreu só pelo corpo?quero entender
ResponderExcluirSe eu entendi bem sua pergunta, a resposta é não; Jesus morreu pelo indivíduo como um todo. Me corrija se eu entendi equivocadamente sua pergunta.
ExcluirExcelente artigo!
ResponderExcluirVlw! :D
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