Uma análise das experiências de quase morte sob uma perspectiva científica e bíblica


Eu planejava escrever uma continuação ao meu artigo anterior, "Mais um argumento contra a existência de uma alma imortal", mas mudei de ideia ao ver que algumas pessoas ainda levam em consideração as experiências de quase morte (que ao longo deste texto serão retratadas apenas pela sigla “EQM”) como uma evidência para a sobrevivência consciente da alma na morte. Particularmente, este argumento nunca me chamou muita atenção, nem mesmo na época em que eu ainda era imortalista, razão pela qual eu não escrevo nem uma linha sobre ele ao longo de todas as mais de 800 páginas do meu livro sobre o tema. Eu me preocupava somente com as evidências bíblicas, como venho fazendo por meio de artigos também. Mas como este tema é de interesse de muita gente, decidi escrever algo a respeito sob uma perspectiva espiritual e científica.


1. Sob uma perspectiva científica

Se as EQM fossem uma prova definitiva e cabal para a existência de uma alma imortal presa em algum lugar no interior do corpo humano, então seria de se perguntar o porquê que ainda existem cientistas e médicos que não creem na existência de uma alma no sentido platônico da mesma. Não deveriam existir médicos ou cientistas ateus, por exemplo. Deveriam estar todos bem convertidos. No mínimo, as evidências nesta área não são muito convincentes ou conclusivas, razão pela qual ela é desdenhada pela esmagadora maioria da comunidade científica. Há muitos cientistas que creem na alma, mas apenas uma minoria insignificante de cientistas que creem na alma por causa das EQM. A maioria crê por razões religiosas, pura e simplesmente. E muitos não creem em nada.

No fundo, o que os imortalistas querem mesmo nos convencer é que temos que crer nas EQM porque a ciência diz isso, quando quase nenhum cientista crê nas EQM! Quem crê geralmente são leigos, estimulados por um ou outro médico em especial. É interessante notar que quase sempre os que estão lutando pela veracidade das EQM como uma “prova” da sobrevivência da alma são pessoas que são qualquer coisa, menos neurologistas. Ou seja: são como jogadores de hóquei no gelo opinando sobre jogadas de xadrez. Os neurologistas mesmo, ou seja, os que estudam a área do cérebro, quase nunca se preocupam em escrever livros ou defender as EQM – na verdade, a grande maioria deles as ignora completamente.

Um artigo escrito por um médico chamado Alex Likerman, publicado originalmente no Happiness in this World e traduzido para o português pelo site Ceticismo Aberto discorre sobre as EQM e refuta a tese de que elas sejam uma prova cabal da sobrevivência ou mesmo existência da alma. Ele escreve:

«Eu nunca tive um paciente que confessasse ter tido uma experiência de quase morte (EQM), mas recentemente me deparei com um livro fascinante chamado O Portal Espiritual no Cérebro (The Spiritual Doorway in the Brain) de Kevin Nelson, que relata que cerca de 18 milhões de americanos podem ter tido uma. Se for verdade, é provável não apenas que alguns dos meus pacientes estejam entre eles, mas também alguns dos meus amigos. O que me levou a pensar: o que exatamente a ciência tem a nos dizer sobre a sua causa?

Que EQMs acontecem não está em disputa. A sequência e os tipos de eventos dos quais elas são compostas são suficientemente similares entre as pessoas que as relatam de tal forma que EQMs poderiam ser consideradas como algum tipo de síndrome, semelhante a uma doença sem causa conhecida. Mas apenas porque milhões de pessoas já viveram EQMs, isso não significa que a explicação mais comumente aceita para elas – que almas deixam os corpos e encontram deus ou alguma outra evidência de vida após a morte – esteja correta.

Afinal de contas, as pessoas interpretam erroneamente as suas experiências o tempo todo (uma ilusão ótica representando o exemplo mais básico). Sem dúvida, muitas pessoas que relatam EQMs são profundamente afetadas por elas, mas, geralmente, mais como um resultado de suas interpretações das experiências (i.e., “a vida após a morte é real”) do que como resultado da experiência em si. Acontece que um número de observações reproduzíveis combinado com uma pitada de conjecturas gerou uma explicação neurológica inteiramente plausível para todos os casos de experiências que incluam EQM.

Em seu livro, Nelson comenta que normalmente 20% do fluxo sanguíneo é direcionado para o cérebro, mas que este fluxo pode abaixar para 6% antes de ficarmos inconscientes (e mesmo nesse nível, nenhum dano permanente será causado). Nelson ainda observa que quando nossa pressão sanguínea diminui demais e desmaiamos, o nervo vago (um longo nervo que se conecta com o coração) desloca a consciência para o sono REM – mas não totalmente em algumas pessoas. Um número de sujeitos parece ser suscetível ao que ele chama de “intromissão REM”.

A intromissão REM ocorre tipicamente, quando ocorre, na transição da vigília para o sono. Nelson descobriu em sua pesquisa que o funcionamento do mecanismo que alterna as pessoas entre o sono REM e a vigília tendeu a ser diferente naquelas que relataram EQMs. Nessas pessoas, ele descobriu que a mudança era mais propensa a “fragmentar e misturar” esses dois estados de consciência (o controle do nosso estado de consciência é localizado no nosso tronco cerebral e é precisamente regulado), fazendo com que essas pessoas exibam simultaneamente características de ambos. Durante a intromissão REM, as pessoas se viram paralisadas (“paralisia do sono”), totalmente despertas, mas experimentando luzes, sensações fora do corpo e narrativas surpreendentemente vívidas. Durante o sono REM, muitos dos centros de prazer do cérebro são estimulados também (animais que tiveram suas regiões REM danificadas perderam todo o interesse em comida e até em morfina), o que pode explicar os sentimentos de paz e unicidade também relatados durante EQMs.

A neurofisiologia também pode explicar o sentimento de estar se movendo através de um túnel, tão regularmente mencionado em EQMs. É bem sabido que pessoas experimentam uma “visão de túnel” imediatamente antes de desmaiar. Experimentos com pilotos girados em centrífugas gigantes têm reproduzido o fenômeno de visão de túnel, aumentando as forças G e diminuindo o fluxo sanguineo em suas retinas (a periferia da retina é mais suscetível a quedas na pressão sanguínea do que o seu centro, de tal forma que o campo de visão parece comprimido, fazendo cenas parecerem vistas dentro de um túnel). Quando óculos especiais que geram sucção foram colocados nos olhos dos pilotos para neutralizar o efeito de queda da pressão sanguínea da centrífuga, os pilotos perderam a consciência sem desenvolver o efeito da visão de túnel – provando que a experiência da visão de túnel é causada por uma redução no fluxo sanguíneo dos olhos.

Talvez o aspecto mais intrigante das EQMs seja o quão costumeiramente elas estão associadas com experiências fora do corpo. Isso também, entretanto, trata-se de uma ilusão. Evidências de que experiências fora do corpo nada têm a ver com almas deixando corpos podem ser encontradas na observação de que elas também têm sido relatadas por pessoas acordando do sono, recuperando-se de anestesia, enquanto estão desmaiando, durante convulsões, durante enxaquecas e quando estão em altas altitudes (não há razão para pensar que as almas das pessoas estão deixando seus corpos durante nenhuma dessas situações não ameaçadoras para a vida).

Mas as evidências mais fascinantes de que experiências fora do corpo são fenômenos neurológicos vêm dos estudos feitos inicialmente na década de 1950 por um neurocirurgião chamado Penfield. Ele estava interessado em compreender como poderia distinguir tecidos cerebrais normais de tumores cerebrais ou “cicatrizes” que eram responsáveis por causar convulsões. Ele estimulou os cérebros de centenas de pacientes conscientes no esforço de mapear o córtex cerebral e entender aonde em nossos cérebros nosso corpo físico é representado.

Um paciente sofria de danos no lobo temporal e quando Penfield estimulou a região temporoparietal do seu cérebro, ele relatou ter deixado o seu corpo. Quando a estimulação parou, ele “voltou”, e quando Penfield estimulou a região temporoparietal de novo, ele deixou o seu corpo mais uma vez. Penfield também descobriu quando variava a corrente e a localização do estímulo, podia fazer os membros do seu paciente parecerem encurtados ou produzir uma cópia de seu corpo que existia ao seu lado!

Em o Cérebro Contador de Histórias (The Tell-tale Brain), V. S. Ramachandran descreve um paciente que teve um tumor removido da sua região frontoparietal direita e desenvolveu um “gêmeo fantasma” ligado ao lado esquerdo do seu corpo. Quando Ramachandran colocou água fria no seu ouvido (um procedimento conhecido como teste calórico de água fria, o qual estimula o sistema de equilíbrio do cérebro, conhecido por ter conexões com a região frontoparietal), o gêmeo do paciente se afogou, movimentou-se e mudou de posições.

Neurologistas têm reconhecido desde então que a região temporoparietal do cérebro é responsável por manter a representação de nossos esquemas corporais. Quando uma corrente externa é aplicada nessa região, ela para de funcionar normalmente e nossa representação do corpo “flutua”. Outras evidências de que esse fenômeno é uma ilusão vêm de experimentos nos quais as pessoas que tiveram experiências fora do corpo enquanto passavam do sono para a vigília eram incapazes de identificar objetos colocados no quarto depois que adormeciam, sugerindo fortemente que a imagem que viram deles mesmos dormindo nas suas camas era reconstruída em sua memória. Embora não exista ainda nenhuma evidência de que níveis baixos de oxigênio no sangue causem disfunção da região temperoparietal da mesma forma que uma corrente aplicada, esta permanece como uma hipótese testável e a explicação mais provável.

Em suma, embora longe de estar provada como uma explicação para o que realmente explica as EQMs, a hipótese da intromissão REM tem mais evidências para corroborá-la do que a idéia de que nós realmente deixamos nossos corpos quando a morte está à espreita»

Como vemos, a ciência já é capaz de explicar cientificamente as EQM sem apelar para a resposta fácil de que “é uma alma saindo do corpo”. E mesmo que ainda não tenhamos todas as respostas para tudo, isso não significa que tenhamos que apelar para a “alma” como a resposta. Isso porque a ciência é um campo que está em constante desenvolvimento; nós sabemos mais hoje do que sabíamos ontem, e conheceremos mais amanhã do que conhecemos hoje.

Todas as evidências científicas apontam causas racionais e não espirituais para as EQM, e mesmo que nós não tenhamos todas as respostas hoje não significa que não tenhamos todas as respostas amanhã, nem justifica uma resposta evasiva e supersticiosa. O fato de os homens do passado não saberem o que causava os raios não justificava que a resposta fosse “os deuses”. O fato de não termos certas respostas hoje no campo da neurologia não justifica que a resposta seja “a alma”.


2. Sob uma perspectiva espiritual/bíblica

Se algo ainda precisa ser explicado espiritualmente, não há problemas com isso, uma vez que os evangélicos e católicos em geral já aceitam com facilidade que coisas como necromancia e mediunidade, por exemplo, não são “provas” da existência de almas ou espíritos ou vida no além, mas sim de demônios. O que o diabo ganharia com isso? A resposta é simples: reforçar uma crença falsa. O objetivo de Satanás é afastar as pessoas da Bíblia através de confirmações “sobrenaturais” de algo antibíblico, que possa distanciar o homem de Deus.

Se cremos que de fato a imortalidade da alma é a primeira mentira de Satanás, presente desde o Jardim do Éden, e que o “certamente não morrerás”(Gn.3:4) é seu lema principal, então é óbvio que ele vai empregar todos os seus esforços para tentar validar esta crença, seja por meios “bíblicos” (deturpando passagens bíblicas isoladas) ou por meios “extra-bíblicos” (fazendo parecer que existe vida fora do corpo). Se o diabo está comprometido com a crença na imortalidade da alma, é ele quem se encarga de dar continuidade e validade à lenda. É por isso que existem centros espíritas com evocação de mortos, é por isso que existem várias visões marianas em tudo quanto é lugar, é por isso que existem milagres em seitas e é por isso que existem as EQM.

O problema é que a esmagadora maioria das pessoas tem extrema facilidade em aceitar o fato de que espíritos malignos estão presentes em coisas como mediunidade, porque crescemos aprendendo isso. E os evangélicos também não vêem problema em pensar o mesmo sobre as “aparições” marianas, pela mesma razão. Mas, paradoxalmente, temos uma enorme hesitação em aceitar que o mesmo princípio se aplica às EQM, isso porque fomos educados com a crença na imortalidade da alma, que com o tempo vai fazendo com a nossa cabeça o que chamamos de tradição.

A dificuldade reside no fato de que derrubar algo que já chegou ao status de tradição é extremamente difícil, ainda mais se o indivíduo em questão for alguém fechado à verdade, que vive dentro de uma bolha. Por causa desta tradição, não usamos do mesmo critério quando pensamos nas EQM, porque parece a princípio absurdo que o demônio esteja envolvido em algo que nós aprendemos que é verdadeiro, embora seja fácil demais acreditarmos que ele esteja envolvido em algo que nós aprendemos que é falso.

Se ele pode aparecer mentalmente em um médium, o que impediria ele de aparecer mentalmente em uma pessoa comum, fazendo-a pensar que viu coisas? Por que a lógica que vale para um caso não vale para outro? Se tivéssemos sido criados desde sempre contra a crença imortalista, a aceitação de que o que ocorre nessas visões mentais é relacionado ao demônio seria muito mais fácil, até porque a mesma razão pela qual o demônio atua em um caso é também a razão pela qual atua no outro: validar uma crença falsa, deixando em dúvida o que consta na Bíblia. Para isso bastaria que o demônio entrasse na mente do indivíduo da mesma forma que entra na mente de um médium e que lhe passasse um quadro mental em que a pessoa “se vê” em um Paraíso.

Mas há ainda muitos outros problemas com as EQM que, se fossem levados em consideração, destruiria o Cristianismo por completo. Em primeiro lugar, é notável que na esmagadora maioria das vezes a pessoa que experimenta uma EQM se vê no Céu, e não no inferno. Existem algumas raras exceções, é verdade, mas são poucas. Pelo menos 99% dos pacientes dizem se ver em um Paraíso. O problema é que estes dados confrontam abertamente o que a Bíblia tem a dizer a respeito. Segundo Jesus, a maioria se perderá, e apenas uma minoria se salvará. Ele disse:

“Entrem pela porta estreita, pois larga é a porta e amplo o caminho que leva à perdição, e são muitos os que entram por ela. Como é estreita a porta, e apertado o caminho que leva à vida! São poucos os que a encontram"(Mateus 7:13-14)

“Alguém lhe perguntou: ‘Senhor, serão poucos os salvos?’ Ele lhes disse: ‘Esforcem-se para entrar pela porta estreita, porque eu lhes digo que muitos tentarão entrar e não conseguirão’” (Lucas 13:23-24)

Biblicamente, são poucos os que se salvam, e são muitos os que se perdem. Nas EQM, em contraste, ocorre que são muitosos que se salvam, e são poucos os que se perdem. Se as EQM realmente retratam uma realidade espiritual, devemos questionar seriamente o que Jesus disse nos evangelhos, e confrontar o ensino bíblico pela “realidade” das EQM. Devemos escolher entre ficar com os relatos de EQM ou com Jesus. Não há meio-termo. Isso seria totalmente previsível caso as EQM fossem mesmo somente o resultado da mente do indivíduo, porque a maioria das pessoas pensa que irá morar no Céu, e não no inferno.

Em segundo lugar, todas as experiências relatadas trazem resultados conflitantes não apenas entre si, mas, principalmente, com a Bíblia. Os relatos são tudo aquilo que deveríamos esperar caso tudo fosse fruto da mente humana: o muçulmano se vê no Paraíso islâmico das sete virgens; o espírita se vê no “mundo dos espíritos” de Alan Kardec; o católico é recepcionado por algum santo na portaria do “Céu”; o hindu se vê no seu tipo de “Paraíso”, e assim por diante. É impressionante notar que não há similaridade nenhuma nos relatos, o que aconteceria caso as EQM fossem reais (neste caso, todas as pessoas estariam descrevendo o mesmo Céu dos cristãos imortalistas ocidentais!).

O Dr. Sammuelle Bacchiocchi, em sua clássica obra “Imortalidade ou Ressurreição?”, escreveu:

“Karlis Osis e Erlendur Haraldsson avaliaram os relatos de mais de 1.000 experiências de quase-morte nos EUA e Índia. Descobriram que a visão dos pacientes hindus era tipicamente indiana, enquanto a dos americanos era ocidental e cristã. Por exemplo, uma mulher indiana de formação universitária teve a experiência de ser conduzida ao céu sobre uma vaca, enquanto um paciente americano que havia orado a São José encontrou o seu santo padroeiro na experiência. Tais relatos sobre experiências de quase morte refletem as crenças pessoais dos pacientes. O que experimentaram no processo de morrer quase certamente condiciona-se a suas crenças pessoais”

É por isso que até hoje nunca houve um médico, cientista ou neurologista que se convertesse ao Cristianismo após analisar os relatos de EQM: porque esses relatos apenas confirmam as crenças pessoas de cada um, seja a pessoa budista, hinduísta, judeu, católico, protestante, espírita, etc. Não me surpreenderia se um dia algum ateu morresse e relatasse uma EQM onde se viu com Richard Dawkins, seu ídolo máster! (Isso infelizmente não é possível porque Dawkins ainda está vivo. Mas espere só alguns anos!).

Se tomássemos como verdadeiras provas da imortalidade da alma os relatos de EQM, não seríamos apenas imortalistas: seríamos relativistas religiosos, daquele tipo que alega que todos os caminhos levam a Deus e que todas as religiões são igualmente verdadeiras. Perceba a ironia aqui presente: o mesmo argumento que o imortalista usa contra o mortalista para validar a crença na imortalidade da alma também poderia ser igualmente usado pelo relativista convencer o imortalista sobre o relativismo religioso! Os dois teriam o mesmo peso, porque partem da premissa de que as EQM são verdadeiros acontecimentos do pós-morte. Naturalmente, o imortalista cristão não faz isso – ele simplesmente faz de conta que todos os relatos de EQM no mundo todo só fazem menção ao Céu cristão e da sua religião em particular.

Isso seria totalmente previsível caso as EQM fossem mesmo somente o resultado da mente do indivíduo, porque as pessoas pensam que o Céu da sua religião é o verdadeiro, e não o Céu das outras religiões.

Em terceiro lugar, se os relatos de EQM são uma prova da sobrevivência da alma, então teríamos que mutilar a Bíblia na questão do juízo. Isso porque o autor de Hebreus é claro ao dizer que depois da morte segue-se o juízo (Hb.9:27), mas em absolutamente nenhum relato de EQM o paciente diz ter ido ao juízo! Ninguém se viu diante de um julgamento; ao contrário, todos se viam no Céu direto. Mais uma vez somos forçados a escolher entre o que as EQM dizem e o que a Bíblia diz, que é isso:

“O homem está destinado a morrer uma só vez e depois disso enfrentar o juízo(Hebreus 9:27)

O autor de Hebreus não diz que o homem morre uma vez e depois disso se encontra no Céu com os anjinhos e ali reencontra a vovozinha e São Pedro com as chaves do céu; ao contrário: ele explicitamente diz que o acontecimento que se segue à morte é o juízo. Quantas pessoas que relataram EQM se viram no juízo? Nenhuma que eu saiba! Isso seria totalmente previsível caso as EQM fossem mesmo somente o resultado da mente do indivíduo, porque as pessoas em geral não estão familiarizadas com a crença bíblica de que após a morte vem o juízo. Elas pensam que vão pro Céu direto.

Em quarto lugar, como o próprio nome afirma por si mesmo, as “experiências de quase morte” não são experiências de pós morte. Para ser claro: aquelas pessoas não tinham morrido ainda. O que o imortalista fanático quer nos fazer acreditar é que a alma da criatura saiu do corpo dela antes mesmo da morte corporal! Isso é fantástico! Na Bíblia não há sequer uma única passagem que diga que a alma sai do corpo na morte, mas esses imortalistas vão além, e chegam ao cúmulo de dizer que a alma sai do corpo antes mesmo da morte!

Isso se parece muito com aquela estorinha que saiu na internet há algum tempo atrás (e para toda fofoca de internet tem sempre um idiota que acredita), que mostrava uma foto em que a tal “alma” do falecido é fotografada saindo do corpo de um paciente. (Depois provaram que a foto era uma falsificação barata. Que surpresa.) Mas como que a alma teria sido fotografada se ela é imaterial, e por esta mesma razão não pode ser vista por olhos humanos ou sair por aí em um álbum de fotos? Se a alma é imaterial, ela não pode ser fotografada. Então, se foi fotografada, não é a alma. Da mesma forma: se a alma só deixa o corpo na morte (conforme a crença imortalista tradicional), ela não sai antes da morte. Então, se algo “saiu” antes da morte, não é a alma.

Em quinto lugar, há outro problema fatal para os “teólogos da EQM”: o fato de milhões e milhões de pessoas terem passado pelo estado de “quase morte” e não terem tido nenhuma história para contar. Há até casos documentados em que pessoas morreram, voltaram à vida e a primeira coisa que vieram importunar, como não podia ser diferente, é “o que viu lá”. E a resposta foi somente: “nada”. Não havia nada para contar. Nenhuma historinha, nenhum anjinho, nenhum Satã no quinto dos infernos, nenhum porteiro no Céu, nenhuma luz no fim do túnel, simplesmente nada. Isso saiu há anos atrás em fóruns adventistas, mas eu fiz questão de não colocar isso como argumento no livro, cujo propósito é estritamente bíblico e histórico. Porém, para os que creem nas EQM, perguntaremos: aquelas pessoas que não tiveram nada a contar é porque não tinham alma? Será que o espírito delas não estava funcionando direito? Será que elas tiveram uma “amnésia celestial”?

Nada disso. A verdade é que isso seria totalmente previsível caso as EQM fossem mesmo somente o resultado da mente do indivíduo, porque há pessoas que não creem em nada depois da morte, e elas estão menos propensas a se verem em algum lugar depois de morrer.

O Dr. Bacchiocchi foi muito oportuno ao dizer, no mesmo livro recém mencionado, que:

“A Bíblia traz um relatório de sete pessoas que foram levantadas dentre os mortos (1Rs.17:17-24; 2Rs.4:25-37; Lc.7:11-15; 8:41-56; At.9:36-41; 20:9-11), mas nenhuma delas teve uma experiência de pós-morte para compartilhar. Lázaro, que foi trazido à vida após estar clinicamente morto por quatro dias, não trouxe qualquer relato de emocionantes experiências fora do corpo. A razão para isso é simples: a morte, segundo a Bíblia, é a cessação da vida da pessoa inteira, corpo e alma. Não existe forma de vida consciente entre a morte e a ressurreição. Os mortos repousam inconscientemente em suas sepulturas até que Cristo os chame no glorioso dia de Sua vinda”

Não é formidável observar que a Bíblia teve todas as oportunidades do mundo para relatar uma “EQM”, uma vez que teve nada a menos que sete pessoas que de fato morreram e poderiam ter contado um monte de historinhas, mas que, curiosamente, nenhuma vez relatou alguma “experiência pós-morte” destas pessoas? Não é surpreendente notar que nenhuma delas teve alguma história para contar sobre os dias em que estiveram mortas? Não é curioso saber que os imortalistas correm desesperados em busca de milhares de relatos de EQM, em que os pacientes contam com a maior empolgação suas histórias como se fosse a coisa mais importante do mundo, mas a Bíblia as ignora completamente, mesmo tendo perfeita e oportuna ocasião para fazê-lo?

O resumo deste estudo é que, seja do ponto de vista científico ou espiritual, não há base sólida suficiente para estabelecer as EQM como uma “prova”, ou mesmo como “evidência” de vida após a morte. O que todas as evidências apontam em conjunto é que essas experiências são frutos da individualidade e subjetividade de cada um, e isso explica tudo: explica porquê quase ninguém se vê no inferno, explica porquê ninguém se vê em um juízo, explica porquê todas elas se vêem no Céu da sua própria religião, explica até mesmo porquê que muita gente não passa por EQM nenhuma!

Nós temos todas as evidências necessárias de que isso é meramente fruto da atividade cerebral do indivíduo em seus últimos momentos de vida, só não sabemos perfeitamente como que isto se dá: e é para isso que existe a neurologia, que cada vez mais lança luz nesta área, colocando os teóricos da EQM com cada vez menos espaço, tendo que recuar cada vez mais. O que nós sabemos é que não precisamos da “alma” para explicar as coisas e seguir adiante. Os teóricos da EQM precisam se agarrar à explicação fantasiosa e irracional para sustentar sua crença em uma alma imortal; nós precisamos apenas deixar que a ciência tome o seu caminho, que os neurologistas sigam o seu curso e que a Bíblia nos direcione em toda a verdade.

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

Por Cristo e por Seu Reino,
Lucas Banzoli (apologiacrista.com)


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Comentários

  1. Lucas, confesso que ainda parece faltar algo, mas mesmo assim veio esclarecer minhas dúvidas e de muitos outros leitores seu presente artigo. Penso que você está quase chegando lá...

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    1. Isso que parece faltar é o que eu já havia exposto no artigo:

      "...e mesmo que ainda não tenhamos todas as respostas para tudo, isso não significa que tenhamos que apelar para a “alma” como a resposta. Isso porque a ciência é um campo que está em constante desenvolvimento; nós sabemos mais hoje do que sabíamos ontem, e conheceremos mais amanhã do que conhecemos hoje (...) o fato de não termos todas as respostas hoje não significa que não tenhamos todas as respostas amanhã, nem justifica uma resposta evasiva e supersticiosa. O fato de os homens do passado não saberem o que causava os raios não justificava que a resposta fosse 'os deuses'. O fato de não termos certas respostas hoje no campo da neurologia não justifica que a resposta seja 'a alma'"

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  2. Lucas, a paz de Cristo.
    Eu gostaria que você me explicasse o significado destes versículos, que dizem que o evangelho foi pregado aos mortos e que eles vivem segundo Deus em espírito:
    I Pedro 4:5-6: Os quais hão de dar conta ao que está preparado para julgar os vivos e os mortos. Porque por isto foi pregado o evangelho também aos mortos, para que, na verdade, fossem julgados segundo os homens na carne, mas vivessem segundo Deus em espírito;
    Desde já agradeço a resposta.

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    1. Olá, Felipe, a paz!

      Eu vou transcrever aqui o que a própria nota de rodapé da NVI, que é de linha imortalista, escreve sobre este texto:

      "Julgar os vivos e os mortos" - i.e, os que estarão ou não com vida quando raiar o dia do Juízo Final.

      "Por isso mesmo" - a razão é expressa adiante, na frase que começa com um "para que" - não tem ligação com o versículo anterior.

      "Foi pregado também a mortos" - essa pregação foi um acontecimento passado, a pessoas que então viviam, mas já estavam mortas nos dias do autor da carta (não haverá oportunidade para as pessoas serem salvas após a morte; v. Hb 9.27).

      "Viviam pelo Espírito segundo Deus" - a segunda razão por que o evangelho foi pregado aos que depois morreram. Para alguns, significa que toda a pregação do evangelho tem como alvo levar os ouvintes a viver como Deus vive - eternamente - e que essa vida é dada pelo Espírito Santo. Para outros, significa que o motivo supremo da pregação do evangelho é que o povo de Deus, mesmo abusado e assassinado pelo mundo mau, tenha a vida eterna, transmitida pelo Espírito Santo.

      Vale ressaltar que essa é a maior Bíblia de Estudos do mundo e que seus tradutores e comentaristas adotam a linha de imortalidade da alma, mas mesmo assim reconhecem que estes versos não tem nada a ver com isso. A passagem simplesmente está dizendo que o evangelho foi pregado aos que hoje estão mortos (mas que obviamente estavam vivos na época em que a pregação foi feita), para que eles pudessem viver pelo Espírito (a NVI dá duas possibilidades para esta "vida", nenhuma delas é de uma alma incorpórea em um estado intermediário!).

      E vale ressaltar, por fim, que MUITOS comentaristas bíblicos creem que estes versos falam de MORTE ESPIRITUAL, em especial os exegetas calvinistas. Segundo eles, os versos em questão dizem que Deus decidiu que o evangelho fosse pregado indistintamente tanto para os vivos quanto para os mortos espirituais, para que pudessem ter vida. Seja física ou espiritualmente, o fato é que estes versos não provam, de forma alguma, que a alma é "imortal".

      Abraços!

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    2. Teria como você fazer um artigo mais detalhado sobre este texto ou então me indicar um já produzido? Desde já muito obrigado.

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    3. Tem esse aqui:

      http://desvendandoalenda.blogspot.com.br/2012/12/os-espiritos-em-prisao.html

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  3. Irmão, não recebi sua resposta a um primeiro questionamento sobre E.Q.M. Por isto refaço a questão. Particularmente conheci duas pessoas que morreram e as mesmas provam com o próprio atestado de óbito. Uma possui até os furos no crânio onde recebeu os tiros que causou-lhe a morte e a outra, uma mulher, morreu porque sofreu um eclampse durante a gravidez. ambos ficara de dois a três dias na geladeira do I.M.L. e inclusive a mulher, foi formolizada. Ressuscitaram por meio da oração da fé e da revelação do Espírito Santo e ambos tiveram experiências com o inferno conscientes, mesmo estando em estados de morte física. Gostaria que explicasse tais fatos, pois não são casos isolados. Obs: conheci pessoalmente essas duas pessoas, que apresentaram provas irrefutáveis de seus testemunhos.

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    1. Olá, Alexandre, a paz.

      Infelizmente já faz tempo que algumas pessoas tem observado e reclamado que os comentários não são publicados, e quando eu vou para a moderação de comentários não encontro nenhum comentário da pessoa ali. Já fiz algumas notas a este respeito, mas o problema persiste. Caso o seu comentário (ou de qualquer outra pessoa que eventualmente esteja lendo isso agora) não tenha sido publicado, não hesite em enviá-lo de novo mais tarde. Os únicos comentários que eu não aprovo são aqueles vindos de vândalos ou trolls (ou de um rapaz que persistentemente reza o Ave-Maria nos comentários de artigos que não tem nada a ver com o tema).

      Sobre a sua questão, ela é realmente difícil de se responder. Muito mesmo. Primeiro, porque eu teria que ter contato mais direto com a pessoa que passou por essa experiência. Às vezes os médicos se enganam e dão atestado de óbito para pessoas que não morreram ainda. Já vi casos assim. Teria também que saber que tipo de "inferno" que a pessoa viu. Na maioria dos casos que eu vejo testemunharem por aí, eles vão com a própria roupa do corpo ao inferno - algo ridículo, para dizer pouco, mas é o que deveríamos esperar caso tudo tenha se tratado de um quadro mental na cabeça da própria pessoa. E por mais que você os considere confiáveis (e eu não duvido disso), há sempre casos de pessoas que conseguem enganar bem, muito bem (inclusive fraudando documentos). Se apenas 1 a cada 1 milhão de cristãos no mundo fizesse isso, já teríamos uns mil saindo por aí com essas histórias (e o provável é que existam bem mais). É por isso que não podemos fundamentar doutrinas com base em meros testemunhos pessoais, por mais aparentemente confiáveis que sejam. A pessoa pode até provar que ela morreu mesmo, mas como vai provar que realmente esteve no inferno?

      O segundo grande problema em responder a esta pergunta provém do fato de que a neurociência ainda está engatinhando neste aspecto. A ciência já avançou muito em relação a muita coisa, mas o cérebro é uma das áreas ainda menos "exploradas" cientificamente. Muito ainda permanece como mistério, e eu não sou apto para desvendar os mistérios da ciência que podem ser desvendados daqui 100, 500 ou 20.000 anos. Eu só posso dar a minha OPINIÃO pessoal sobre o que acontece nesses casos, mas repito que isso é mera opinião (da mesma forma de que a opinião de quem crê que é uma alma saindo do corpo também não passa de opinião, já que nunca se provou a existência de uma).

      Em minha opinião, essas pessoas que morreram e voltaram a viver podem ter tido essa visão mental momentos antes da morte; então ela morre e fica sem pensar (pois está morta) e quando ressuscita a primeira coisa que ela tem em mente é precisamente a última coisa que havia passado pela cabeça antes. Desta forma, ao ressuscitar, a pessoa acredita que passou este meio-tempo no Céu ou no inferno (ou onde quer que ele tenha se visto), quando na verdade aquilo não se deu neste meio-tempo, mas sim naquele pequeno tempo antes da morte, quando a pessoa fica sem oxigênio e o cérebro começa a ter alucinações que para ele são bem reais. A mesma coisa pode acontecer no sentido inverso, ou seja, de a pessoa ressuscitar e ter essas visões antes de tomar consciência de si novamente, e então pensar que aquilo ocorreu literalmente (e não apenas mentalmente) e no meio-tempo (e não no período de pós-ressurreto). Como eu já disse, há muito ainda a se examinar e se aprofundar a este respeito. Precipitado seria suplantarmos as Escrituras - a Palavra inspirada de Deus que é bem clara a este respeito - para seguirmos testemunhos pessoais que, confiáveis ou não, podem ser meramente interpretações equivocadas da mente do indivíduo, que está honestamente enganado.

      Abraços.

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  4. "É por isso que até hoje nunca houve um médico, cientista ou neurologista que se convertesse ao Cristianismo após analisar os relatos de EQM"

    Gostaria de saber a sua opinião sobre o relado do Doutor Eben Alexander, no livro "Uma prova do céu".

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    1. Eben Alexander nunca foi um ateu que se converteu ao Cristianismo depois da sua EQM, ele próprio disse que se considerava um "cristão fiel" antes da sua experiência, portanto já estava inclinado a aceitar a explicação mais fácil e ganhar muito dinheiro vendendo um best-seller sobre algo sobrenatural do que aceitar a explicação científica. De todo modo, o próprio médico que cuidou dele no coma desmentiu a sua versão, e cientistas e neurocirurgiões sérios como Oliver Sacks e Sam Harris refutaram a experiência e explicaram o que de fato aconteceu com ele:

      http://www.theatlantic.com/health/archive/2012/12/seeing-god-in-the-third-millennium/266134/

      https://www.samharris.org/blog/item/this-must-be-heaven

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