O batismo por imersão na igreja primitiva
A Igreja Ortodoxa e a
grande maioria das igrejas protestantes têm mantido o batismo por imersão como
a norma padrão do batismo cristão, sendo o batismo por aspersão ou por infusão admissível
apenas em casos extremos onde não há água suficiente para se realizar o batismo
bíblico por imersão. A Igreja Romana, é claro, batiza por infusão. Afinal, qual
era a principal forma de batismo praticada na igreja primitiva? Desde muito
cedo vemos a Didaquê, geralmente datada entre 60 a 90 d.C, dizendo:
“Quanto
ao batismo, procedam assim: Depois de ditas todas essas coisas, batizem em água corrente, em nome do
Pai e do Filho e do Espírito Santo. Se
você não tem água corrente, batize em outra água; se não puder batizar em
água fria, faça-o em água quente. Na
falta de uma e outra, derrame três vezes água sobre a cabeça, em nome do
Pai e do Filho e do Espírito Santo. Antes do batismo, tanto aquele que batiza
como aquele que vai ser batizado, e se outros puderem também, observem o jejum.
Aquele que vai ser batizado, você deverá ordenar jejum de um ou dois dias”[1]
Como vemos, a forma
padrão do batismo era em “águas correntes” (imersão), e era somente na ausência de águas correntes (i.e, quando
não havia água suficiente para se realizar a imersão) que o batismo por infusão
era admitido.
Na Epístola de
Barnabé, às vezes atribuída ao Barnabé da Bíblia e às vezes a um Barnabé de
Alexandria (80-150), mas ainda de data bem antiga, há novamente a clara menção
sobre “descer para a água” e “subir dela”, o que implica em um lugar
em que há água suficiente para realizar o batismo por imersão, onde a pessoa
fica imersa na água e depois sobe dela:
“Notai
que ele designa ao mesmo tempo a água e a cruz. Com efeito, ele quer dizer:
Felizes aqueles que, tendo lançado sua esperança na cruz, desceram para a água. Pois ele diz que o salário vem ‘no tempo
certo’. Então, diz ele, eu retribuirei. Mas para hoje, ele diz: ‘Sua folhagem
não cairá’. Isso significa que toda palavra de fé e amor que sair da vossa boca
será para muitos causa de conversão e de esperança”[2]
“Isso
significa que descemos para a água
carregados de pecados e poluição, mas subimos dela para dar frutos em nosso
coração, tendo no Espírito o temor e a esperança em Jesus. ‘Quem comer
deles viverá eternamente’, quer dizer: quem escutar, quando tais palavras são
ditas, e crer nelas, viverá eternamente”[3]
Justino Mártir (100-165), apesar
de não ser explícito, se refere ao batismo como sendo um “banho”[4]
e um “banho completo”[5],
em linguagem diametralmente oposta a uma simples infusão de pequenas quantidades
de água sobre o batizado.
Tertuliano (160-220), no mesmo
livro em que rejeita o batismo infantil, fala também sobre “mergulhar na água”, novamente em oposição a uma simples infusão ou
aspersão:
“O
ato do batismo em si é carnal, pois estamos mergulhados na água, mas o efeito é espiritual, pois somos
libertados do pecado”[6]
“[No
batismo] o homem é mergulhado na água,
em meio à pronunciação de algumas poucas palavras, e em seguida sobe novamente”[7]
O batismo por imersão
continuou sendo a prática-padrão na igreja por muito tempo, visto que Cirilo de
Jerusalém (313-386) expôs em sua Segunda Catequese Mistagógica:
“Depois
disto fostes conduzidos pela mão à santa piscina
do divino batismo, como Cristo da cruz ao sepulcro que está à vossa frente.
E cada qual foi perguntado se cria no nome do Pai e do Filho e do Espírito
Santo. E fizestes a profissão salutar, e fostes
imersos três vezes na água e em seguida emergistes, significando também com
isto, simbolicamente, o sepultamento de três dias de Cristo. E assim como nosso
Salvador passou três dias e três noites no coração da terra , do mesmo modo
vós, com a primeira imersão,
imitastes o primeiro dia de Cristo na terra, e com a imersão, a noite. Como aquele que está na noite nada
enxerga e ao contrário o que está no dia tudo enxerga na luz, assim vós na imersão, como na noite,
nada enxergastes; mas na emersão, de
novo vos encontrastes no dia”[8]
Note ainda que Cirilo
fala sobre a “santa piscina do divino
batismo”, que nada mais era senão uma referência aos batistérios da
igreja primitiva, que os arqueólogos têm encontrado abundantemente nas antigas
igrejas cristãs (veja
uma aqui). Por que os cristãos da época teriam
“piscinas” em seus templos, se para realizar o batismo era necessário apenas um
pouquinho de água jogada na cabeça do batizado?
Em sua Terceira
Catequese Mistagógica, Cirilo diz também:
“Ele
[Jesus], quando banhado no rio Jordão e comunicando às águas a força da
Divindade, delas saiu e se produziu sobre ele a vinda substancial do Espírito
Santo, pousando igual sobre igual. Também a vós, ao sairdes das águas sagradas da piscina, se concede a unção, figura
daquela com que Cristo foi ungido”[9]
Gregório de Nissa (335-394)
também vivia na época em que a norma-padrão de batismo era por imersão. Ele
afirmou que os batizados recebiam “três imersões na
água”[10],
e comparou o batismo cristão com as imersões
de Naamã, o sírio:
“Quando
Naamã, o sírio, caiu doente com lepra, e suplicou pela cura, o levaram ao
Jordão, indicando claramente o que estava por vir, tanto pelo uso da água em
geral quanto da imersão no rio, em
particular”[11]
Ou seja, para
Gregório, a imersão de Naamã no Jordão prefigurava o uso da água e a imersão
nela que viria no batismo.
Agostinho, da mesma forma, escreveu:
“Esses justos, como fiéis e verdadeiros servos de Deus, ao depositar o fardo do século, aproximam-se do banho sagrado e do batismo, e erguendo-se de lá, sob a ação fecundante do Espírito Santo, produzem o fruto do duplo amor - o de Deus e o do próximo (...) Eles deixaram sua lã como se fossem os fardos desse mundo, e sobem do lavatório, isto é, do batismo, e dão à luz dois cordeirinhos gêmeos, isto é, o duplo preceito do amor. E nenhuma é estéril desse santo fruto”[12]
Agostinho, da mesma forma, escreveu:
“Esses justos, como fiéis e verdadeiros servos de Deus, ao depositar o fardo do século, aproximam-se do banho sagrado e do batismo, e erguendo-se de lá, sob a ação fecundante do Espírito Santo, produzem o fruto do duplo amor - o de Deus e o do próximo (...) Eles deixaram sua lã como se fossem os fardos desse mundo, e sobem do lavatório, isto é, do batismo, e dão à luz dois cordeirinhos gêmeos, isto é, o duplo preceito do amor. E nenhuma é estéril desse santo fruto”[12]
João Crisóstomo
(347-407), na mesma época de Agostinho, também dizia:
“Ser
batizado, pois, mergulhar, em seguida
emergir é sinal da descida às regiões inferiores e subida de lá. Por isso
Paulo também chama o batismo de sepulcro, nesses termos: Pelo batismo nós fomos
sepultados com ele na morte (Rm 6,4)”[13]
Até mesmo Calvino, que
batizava por aspersão, admitiu:
“A
palavra batizar quer dizer imergir, e é claro que o rito da imersão foi
observado nas igrejas primitivas”[14]
Em suma, a forma
principal e normativa de batismo na igreja primitiva era, claramente, a imersão
em água, sendo o batismo por infusão admitido somente em casos onde não havia
água suficiente para se realizar o batismo por imersão, que figura bem mais
apropriadamente o fato do batismo representar nosso “sepultamento” para o
pecado (imersão) e “ressurreição” para uma vida nova (emersão):
“Isso
aconteceu quando vocês foram sepultados com ele no batismo, e com ele foram
ressuscitados mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os
mortos” (Colossenses 2:12)
“De
sorte que fomos sepultados com ele pelo batismo na morte; para que, como Cristo
foi ressuscitado dentre os mortos, pela glória do Pai, assim andemos nós também
em novidade de vida” (Romanos 6:4)
A Igreja Romana, é
claro, altera a ordem praticada por séculos na igreja primitiva e impõe o
batismo por infusão como a norma-padrão do batismo, seja ele infantil ou adulto,
e a imersão apenas secundariamente. Nada novo debaixo do sol para uma igreja
bastante conhecida por inovações doutrinárias travestidas de “desenvolvimento
da doutrina”.
Paz a todos vocês que
estão em Cristo.
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[1]
Didaquê, 7:1-4.
[2]
Epístola de Barnabé, 11:8.
[3]
Epístola de Barnabé, 11:11.
[4] 1ª
Apologia, 61:3; 61:10.
[5] 1ª
Apologia, 62:1.
[6] Do
Batismo, c. 7.
[7] Do
Batismo, c. 2.
[8]
Segunda Catequese Mistagógica, c. 4.
[9] Terceira
Catequese Mistagógica, c. 1.
[10]
Gregório de Nissa, O Batismo de Cristo.
[11]
A Doutrina Cristã, 6:7.
[14] Institutas,
p. 1320 (IV.xv.19).
Somente a Igreja Presbiteriana tem o batismo por aspersão, não é ?
ResponderExcluirTambém a Anglicana e a Luterana.
ExcluirA Metodista também.
ExcluirCoincidentemente as igrejas protestantes mais velhas...Seria isto uma herança ruim da ICAR ?
ExcluirÉ natural que nem tudo tenha sido reformado do dia para a noite, isso é fruto de um processo. A Reforma do século XVI foi um importante início, mas não o fim. O próprio lema dos reformados era “Ecclesia reformata, semper reformanda” (Igreja reformada, sempre reformando).
ExcluirEu por exemplo sou da IELB e rejeito o batismo por aspersão (mas evito de me manifestar para qualquer um na congregação, imagino que vá gerar polêmica).
ExcluirO batismo era por imersão e a Bíblia sugere isso quando avisa que Joao batizava num certo lugar por que "havia ali muitas águas":
ResponderExcluir" Ora, João batizava também em Enom, junto a Salim, PORQUE havia ali muitas águas; e vinham ali, e eram batizados", João 3:23.
Não haveria necessidade de "muitas águas" se o batismo fosse aplicado com alguns pingos na testa.
Por outro lado joga-se nas águas qualquer pessoa nos dias de hoje, mas o importante é saber se elas vão ser batizadas no Espírito Santo que é a lavagem do homem interior (Ef 5:26; Tito 3:5). Esse é o batismo que Jesus veio realizar. João Batista garantiu isso quando insinuou que o batismo dele era inferior ao verdadeiro batismo:
"E eu, em verdade, vos batizo com água, para o arrependimento; MAS aquele que vem após mim é MAIS PODEROSO do que eu; cujas alparcas não sou digno de levar; ELE VOS BATIZARÁ com o Espírito Santo, e com fogo", Mat 3:11.
Paulo, o único que entendeu a graça de Deus, não praticava o batismo nas águas:
"Porque Cristo enviou-me, não para batizar...", 1 Cor 1:17.
Os que estão debaixo da lei hoje, adoram jogar pessoas na água e fazer campanhas sim fim. Gostam de subir montes e agonizar até de manhã, gostam dos 40 dias do jejum santo, de passar pelo túnel dos 70, de roupas ungidas, de frequentar as 100 semanas da família, de sacrificar as pessoas até elas caírem exaustas.
Estão todos debaixo da lei e a lei não foi feita para o justo. Isso não muda a vida de ninguém. Milhares de pessoas
"oferecem dons e sacrifícios que, quanto à consciência, não podem aperfeiçoar aquele que faz o serviço;
Consistindo somente em comidas, e bebidas, e várias abluções e justificações da carne, impostas até ao tempo da correção", Hebreus 9:9,10.
Estão ainda debaixo de leis e, enquanto assim permanecem não verão a graça de Deus, pois continuam dentro do velho tabernáculo. É isso que diz Hebreus:
"o caminho do santuário não estava descoberto enquanto se conservava em pé o primeiro tabernáculo", Hb 9:8.
Tem muita coisa fora do lugar, Lucas. O Cristianismo quase todo está debaixo da lei!
Tem milhares de ministros no Templo e eles não podem comer do altar da graça porque estão debaixo da lei:
"Temos um altar, de que não têm direito de comer os que servem ao tabernáculo", Hebreus 13:10.
São ministros da Velha Aliança!
Assim é que fica bom he he he, quando a mensagem é considerada um “escândalo para os judeus” e uma “loucura para os gentios” (1 Co 1:23).
ExcluirLucas, os católicos e o pastor Augustus Nicodemus, costumam usar Mt 19, 14, onde diz: ..“Deixai vir a mim os pequeninos e não os impeçais"... para sustentar a tese do batismo de crianças. Realmente essa passagem dar margens para batismo de crianças?
ResponderExcluirEste texto não fala absolutamente nada de batismo. Jesus não disse "deixai BATIZAR os pequeninos", mas sim: "deixai vir a mim os pequeninos". Dizer que o texto está falando qualquer coisa de batismo é incorrer em pura eisegese, como quem tenta injetar em um texto um significado que não está nele. Abs.
ExcluirLucas,
ResponderExcluirEstudei o seu artigo e comentei na minha página, com desenvolvimento do assunto...
Gledson.
Lucas ótimo esse texto estou estudando aqui pesquisando em alguns sites e seu texto tem otmas colocações pra mim valeu abraços!!!!
ResponderExcluirObg!
ExcluirSentido da palavra batismo:
ResponderExcluirBatismo no grego = (Batisma)= Rito ou cerimônia de batismo.
E o sufixo MA da palavra BatisMA, enfatiza que é um resultado, ou seja , do arrependimento sincero. ( batisma= submergindo, imersão.
A palavra batisma vem da palavra grega batizó = eu mergulho, submergir, mergulhar cerimonialmente, eu batizo.
E a palavra batizó vem da palavra grega baptó = eu msrgulhar, imersão , mergulhados.
Então a palavra batismo é ligada quanto a questão da imersão, ou seja o batismo o foco sempre foi por imersão e e um sincero arrependimento ( Atos 2:38 ).
Ou seja ,cai por terra essa de que se deve batizar por aspersão ou infusão.
ExcluirLucas, já ouvi gente dizendo que o batismo por aspersão é invalido e se a pessoa ter sido batizada através desse batismo, ela terá que será rebatizada com o Imersão. Você concorda ou isso é muito ''radical''?
ResponderExcluirNão concordo, é um radicalismo sim.
ExcluirE quando a pessoa é batizada quando nasce ? Você acha que é necessita de outro batismo ?
ExcluirNeste caso sim.
ExcluirExcelente artigo!
ResponderExcluirVlw!
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