A Primeira Cruzada (Os massacres em Antioquia e Maara)
• A Cruzada Oficial
A Primeira Cruzada reuniu uma
multidão imensa de pessoas para os padrões da época. Os cronistas falam em 700
ou 800 mil, mas Duché alerta que essas são cifras medievais, que não devem ser
levadas muito a sério[1].
Foucher de Chartres, que participou da Primeira Cruzada, avaliou em 600 mil a
multidão imensa de clérigos, criados e servos, arqueiros, mulheres e crianças
que formavam o confuso e heterogênico séquito dos barões[2]. A
princesa Ana Comnena, filha do imperador Aleixo I, disse que a Europa estava
arrancada de seus fundamentos e se precipitava sobre a Ásia, ao contemplar a
inumerável multidão dos cruzados[3].
Todavia, os cruzados não tinham
um plano de conjunto, nem eram liderados por um único comandante. Em vez disso,
cada cavaleiro se juntou a quem lhe agradava:
Faltou um completo plano de conjunto.
Cada cavaleiro se agregou a quem lhe agradava, mas sem se comprometer tampouco
a lhe obedecer. Distribuídos por nações, se encaminharam por diferentes rotas:
os alemães e os franceses do Norte, dirigidos por Godofredo de Bouillón, duque
da Baja Lorena, e seu irmão Balduino, seguiram o curso do Danubio; Raimundo de
Tolosa com os demais cruzados provinciais e o legado papal passaram por
Lombardía para Dalmacia e o Epiro; os normandos de Sicilia, com Boemundo de
Tarento, cruzaram o Adriático e se dirigiam a Bizâncio; finalmente, os
franceses, que mandavam Hugo de Vermandois, irmão do rei da França, Roberto de
Normandía e o conde de Flandes seguiram pela Itália até Brindisi, e ali
embarcaram para seguir a mesma rota que os sicilianos. Todos se reuniram em
Constantinopla.[4]
Lins confirma que “cada contingente agia isoladamente sob a direção de seu
respectivo chefe feudal, cujas insígnias seguia. Chegou, assim, cada esquadrão
a Constantinopla”[5].
• Em Constantinopla
Ao chegarem a Constantinopla, “não foram muito bem recebidos pelo imperador Aleixo I
Comneno, que se mostrou receoso das intenções que puderam animar aos chefes de
tão grande exército, ao que proibiu penetrar em Constantinopla”[6].
Roper diz que “o imperador de Constantinopla ficou
compreensivelmente alarmado com a resposta ao seu apelo. Sentia-se como o
aprendiz de feiticeiro que conjurara uma força mais terrível do que imaginara”[7],
e Duché alega que “o patriarca havia pedido ajuda,
e a resposta havia superado todas as suas esperanças e as convertia em terror”[8].
Vara afirma que “os exércitos que convergiram em
Constantinopla alarmaram os bizantinos, que só haviam solicitado mercenários,
tal como nos descreve Ana Comneno”[9].
Valentin diz que o próprio fato
deste movimento partir da Igreja Romana, para a qual a Igreja Grega era
maldita, já era suspeito demais[10].
Franco explica a desaprovação dos bizantinos às Cruzadas nas seguintes
palavras:
Desenvolveu-se no Ocidente a
concepção de guerra santa, existente, aliás, entre os muçulmanos. Os bizantinos,
contudo, não aceitavam aquela ideia, já que para eles nenhuma guerra era santa,
mas apenas necessária; morrer na luta não seria um martírio, pois os mártires
enfrentavam o inimigo apenas com as armas da fé. A princesa e cronista
bizantina Ana Comneno indignava-se ao ver cruzados lutando na Semana Santa, e
entre eles sacerdotes armados e empenhados no combate. Esta diferente visão das
coisas explica, a par de razões políticas e econômicas, a desaprovação
bizantina frente às Cruzadas.[11]
Tal era a desaprovação dos
bizantinos às Cruzadas que Michaud diz que os gregos “não
podiam compreender o que se ia fazer em Jerusalém”[12].
Enquanto esperavam no lado de
fora, os cruzados admiravam as “incomparáveis
fortificações de Constantinopla”[13],
e, ao entrar, Godofredo de Villehardouin descreve o quão maravilhados os
cruzados ficaram ao contemplar uma cidade tão magnífica, à qual nada na Europa
se comparava:
Posso assegurar que todos aqueles que
não haviam visto Constantinopla antes contemplavam a cidade com toda sua
atenção, pois nunca haviam imaginado que pudesse existir no mundo um lugar tão
maravilhoso. Olhavam suas altas muralhas e nas sublimes torres que a rodeavam,
avistaram seus ricos palácios e suas elevadas igrejas, que eram tantas que
ninguém teria crido se não tivessem visto com seus próprios olhos, e viram o
comprimento e largura que era essa cidade que reina suprema sobre todas as
demais.[14]
Michaud descreve também que “os cavaleiros, segundo dizem os historiadores do tempo,
não se cansavam de admirar os palácios, os belos edifícios, as riquezas da
capital”[15]. Eles viam pela
primeira vez “o espetáculo do luxo do Oriente”[16],
diante do qual ficaram espantados[17].
Depois de algum tempo, o
imperador Aleixo permitiu que os cruzados entrassem em Constantinopla, após
obrigá-los a prestar um juramento no qual prometiam que iriam devolver todas as
terras conquistadas aos bizantinos. Como já vimos no capítulo 3, esta promessa
não foi cumprida por nenhum deles. O conde de Tolosa foi o único a se recusar a
prestar juramento, e até “ameaçou destruir
Constantinopla”[18]. O imperador, para
dobrar o orgulho de Raimundo e de seus provençais foi obrigado a se prostrar
diante deles[19].
Boemundo, não satisfeito,
decidiu saquear Constantinopla, o que só não ocorreu graças à paciência de
Godofredo:
Boemundo acabava de chegar a Durazzo.
Julgou que era chegado o momento de atacar o império grego e de dividir seus
despojos. Mandou embaixadores a Godofredo para convidá-lo a se apoderar de
Bizâncio, prometendo unir-se a ele com todas as suas forças para aquele grande
empreendimento; mas Godofredo não se esqueceu de que havia tomado as armas para
a defesa do santo sepulcro: rejeitou por isso as propostas de Boemundo,
lembrando-lhe o juramento que tinham feito de combater os infiéis.[20]
Mesmo assim, a multidão de
desocupados e revoltados começou a realizar saques na cidade:
Aleixo estava pronto para lidar com
eles. Suas tropas escoltaram-nos através dos Balcãs e, em seguida, por serem
numerosas demais para serem alimentados e vigiados em um único acampamento,
dividiram-nos em três companhias. Uma passaria o inverno em um acampamento nas
proximidades de Filipópolis, a segunda, perto de Adrianópolis e a terceira, nos
arredores de Rodosto – mas, mesmo assim, eram demasiado turbulentos para serem
controlados. Os três grupos começaram a assolar a região em que se encontravam,
saqueando as cidades, arrombando celeiros e roubando até as igrejas.[21]
Àquela altura, porém, já chegara aos
lombardos a notícia de que havia outros cruzados a caminho. Recusaram-se a
transpor o Bósforo enquanto os reforços não chegassem. Para obrigá-los a
prosseguir, as autoridades imperiais cortaram-lhes os suprimentos – pelo que
eles imediatamente atacaram os muros da cidade e invadiram o pátio do palácio
imperial de Blacherne, onde mataram um dos leões de estimação do imperador e
tentaram forçar os portões. O arcebispo de Milão e o conde de Biandrate, que
haviam sido bem recebidos pelo imperador, ficaram horrorizados. Correram para o
meio da multidão revoltosa e conseguiram ao menos convencê-los a retornar para
o acampamento. Em seguida, tiveram de enfrentar a tarefa de apaziguar o
imperador.[22]
A esta altura, o imperador
Aleixo I Comneno já havia se arrependido de ter deixado os cruzados entrarem na
cidade[23].
Mas já era tarde. “A multidão atacava as regiões
vizinhas e as devastava; não poupava nem mesmo as casas imperiais e a capital,
não obstante suas defesas, temia os horrores do saque”[24].
Michaud escreve:
O que
havia de mais aflitivo, é que todos pareciam ter esquecido os turcos. Os
guerreiros latinos teriam preferido fazer guerra aos gregos, por causa dos
despojos; Alexis estava ocupado somente em submeter ao seu império, os
príncipes da cruz, e não pensava mais que as bandeiras muçulmanas flutuavam em
Niceia.[25]
Depois de muito tumulto e
confusão causados pelos cruzados, Aleixo finalmente conseguiu enviá-los para o
Bósforo, onde encontrariam Niceia, seu primeiro triunfo nas terras inimigas.
• Em Niceia
Os cruzados chegaram em Niceia
em maio de 1097, e tomaram a cidade depois de um mês de difícil cerco[26].
No entanto, eles não conseguiram tomar a cidade para si, porque os turcos preferiram
entregar a cidade a Aleixo do que serem trucidados pelos cruzados sedentos de
sangue, o que deixou os cruzados furiosos:
A campanha começou com o cerco à
cidade de Niceia, que os turcos haviam ocupado alguns anos antes, local
estrategicamente importante por sua proximidade de Constantinopla. O bloqueio
dos cruzados por terra foi eficiente, mas eles precisavam de apoio naval, que o
imperador forneceu, isolando totalmente a cidade. Assim, os turcos resolveram
capitular, entregando Niceia a Aleixo, que garantia em troca respeitar a vida
de seus habitantes. Para os cruzados esse acordo foi encarado como uma traição,
que arrancava aos ocidentais a possibilidade de uma vitória militar completa,
cheia de glória e saques.[27]
• Em Edessa
Edessa não fazia parte do
caminho necessário para chegar a Jerusalém, mas fazia parte dos planos pessoais
de Balduíno, que com a morte de sua esposa rica precisava de novas terras e
riquezas para si. Por isso ele foi ao encontro desta cidade, ainda governada
por um líder cristão ortodoxo, mandou assassiná-lo e tomou o comando:
Se sabia que em Edessa, Balduíno
havia obrigado a Thoros, príncipe armênio que de milagre sustinha ainda a
cidade em pleno país turco, a que o reconhecesse como filho adotivo e herdeiro:
emocionante cerimônia, no transcurso da qual o velho príncipe havia selado com
um beijo o intercâmbio de fés, depois do qual, uma providencial revolta havia
acabado com o pai adotivo e levado o primeiro barão franco a um trono do
Oriente.[28]
Morrisson diz que “nem por um momento se considerou a possibilidade de
devolver a Bizâncio essa cidade que lhe pertencera anteriormente à chegada dos
turcos”[29].
Depois de assassinar o príncipe cristão que governava a cidade e tomá-la para
si, os cruzados seguiram para Antioquia.
• Em Antioquia
Assim como em Edessa, tomar
Antioquia não era obrigatoriamente necessário para se chegar a Jerusalém. No
entanto, os cruzados seguiram com a prática de tomar territórios para fins
pessoais, desta vez para Boemundo. Duché escreve que “tomar
Antioquia era para Boemundo um assunto pessoal. Ou seja, que tentava tomar para
ele. E os outros barões, dando conta de que nada podiam fazer sem aquele diabo
de homem, o consentiram”[30].
O fato de a cidade ter ainda maioria cristã não importava. Todos seriam mortos
pela ambição pessoal de Boemundo por terras e riquezas.
Em Antioquia ocorreu um dos
acordos mais infames da história das Cruzadas: muçulmanos fatímidas propuseram
um acordo com os cruzados, onde Antioquia e Síria ficariam para os cristãos, e
a Palestina e Jerusalém para eles. O trato foi aceito, mas o tempo iria mostrar
que nunca é boa ideia fazer acordos com os bárbaros...
Em escala superior, os califas fatímitas
do Cairo não reconheciam aos califas de Bagdá subjugados pelos turcos, e Síria
e Palestina eram reivindicadas – como muitos anos através o haviam sido – pelo
Egito. Os francos, diante de Antioquia, viram chegar uma embaixada fatímita;
para os francos, Antioquia e Síria; para os egípcios, Jerusalém e Palestina. O
grande visir do Cairo era um armênio convertido ao Islã que compreendeu
clarissimamente o espírito de conquista dos cruzados, mas não de todo o
entusiasmo religioso que os empurrava para a Terra Santa. Trato feito, enquanto
esperavam uma ocasião para rompê-lo.[31]
Maalouf aborda mais sobre o
acordo selado com os muçulmanos fatímidas:
Tendo-lhe o emir despachado uma
embaixada, um acordo é rapidamente concluído: não somente Sultan compromete-se
a abastecer os francos, como também os autoriza a vir comprar cavalos no
mercado de Chayzar e lhes fornecerá guias para que possam atravessar sem
problemas o resto da Síria.[32]
Como parte do acordo, os
egípcios atacaram os turcos na retaguarda pelo Istmo de Suez[33],
enquanto o exército cruzado manteve o cerco à cidade de Antioquia. O problema é
que os cruzados não esperavam que o cerco fosse levar tanto tempo.
Impenetrável, os muros de Antioquia ficaram firmes por oito meses, período no
qual os cruzados passaram por severa fome, chegando ao ponto de praticar
canibalismo. Duché comenta:
O que encontrava um cachorro ou um
gato mortos o comia com grande gosto. Comeram alguns cavalos, mas havia que
guardá-los para as batalhas. Comeram couro, erva, prisioneiros – salvo as
cabeças, que colocavam sobre largas estacas à vista dos inimigos.[34]
Foucher de Chartres, um cronista
que presenciou os acontecimentos, escreveu que “teríeis
rido, ou talvez chorado, ao ver muitos dos nossos, na falta de cavalos, fazer
pacotes dos objetos que lhes pertenciam, e colocá-los sobre o dorso de
carneiros, cabras, suínos e cães. E viam-se cavaleiros armados, montados em
bois”[35].
Outro cronista, também testemunha ocular dos eventos, disse que “de tal modo os nossos sofreram sede, que alguns abriam
as veias de seus cavalos e jumentos a fim de beber seu sangue; outros pediam a
um companheiro que colhesse com as mãos a urina, para com ela mitigar a sede;
outros ainda escavavam o solo úmido, deitavam-se e espalhavam terra no peito,
tamanho era o ardor da sua sede”[36].
Michaud diz também que “os homens, os cavalos e os animais de carga morriam de
fome, de sede e de cansaço”[37].
Brentano escreve:
Não encontrando mais, em volta de seu
imenso acampamento, ervas, cascas e raízes que lhes aplacassem a fome, passaram
a comer seus cavalos, jumentos, camelos, cães e até os ratos que conseguiam
apanhar, chegando o poviléu – a famosa gent
du roi Tafur da epopeia contemporânea – Chanson
d’Antioche – a devorar cadáveres dos sarracenos mortos nos recontros, indo
alguns ao ponto de desenterrá-los no cemitério, que ficava fora dos muros de
Antioquia.[38]
Um cronista que presenciou estas
cenas dantescas disse que “se algum dos nossos se
distanciava do campo e encontrava alguém, também dos nossos, um matava o outro
para despojá-lo”[39]. Não obstante a
fome fosse severa, no acampamento dos cruzados a prostituição rolava à solta,
como já era de costume. Lins diz que “os cruzados
cometiam os piores excessos, transformando-lhes o acampamento em imensa orgia,
a ponto de dizer Gibbon que a história das guerras profanas raramente oferece
cenas de tamanha depravação”[40].
Ele escreve:
Se dermos crédito aos autores
contemporâneos – comenta Michaud, historiador profundamente católico, e,
portanto, insuspeito – todos os vícios de Babilônia reinavam entre os
libertadores de Jerusalém. Espetáculo estranho e inaudito: sob a tenda dos
cruzados, viam-se, a um tempo, a fome e a volúpia, o amor impuro e a
desenfreada paixão do jogo: misturavam-se enfim, à imagem da morte, todos os
excessos da orgia.[41]
Era esse o ambiente em que
congregavam os “heróis da civilização Ocidental”, os “santos guerreiros de
Deus” e mártires que os revisionistas históricos tanto admiram...
Lins comenta que “os mais severos castigos não conseguiam deter a prostituição,
que se tornara geral”[42],
e para acalmar a cólera do Senhor eles resolveram expulsar as prostitutas do
acampamento, as quais obviamente retornaram após a vitória[43].
Depois de oito meses de difícil
cerco, os cruzados conseguiram subornar um traidor muçulmano que abriu uma
brecha na muralha e possibilitou a entrada dos cruzados. Ao entrarem, passaram
ao fio da espada a homens, mulheres e crianças, poupando poucos deles para
virarem seus escravos pelo resto da vida. O massacre foi gigantesco. Maalouf o descreve:
A cidade está incendiada e o sangue
corre. Homens, mulheres e crianças tentam fugir pelas ruelas lamacentas, mas os
cavaleiros os alcançam sem esforço e cortam-lhes o pescoço imediatamente. Pouco
a pouco, os gritos de horror dos últimos sobreviventes se apagam, logo
substituídos pelas vozes desafinadas de alguns saqueadores francos já
embriagados. A fumaça sobe de muitas casas incendiadas. Ao meio-dia, um véu de
luto envolve a cidade.[44]
O que mais apavora no genocídio
de Antioquia é que a maior parte da população assassinada da cidade era cristã.
Os cruzados não tiveram misericórdia nem consideração por este fato.
Massacraram os cristãos ortodoxos sem piedade, juntamente com os muçulmanos.
Quanto aos turcos escravizados, Bastos diz que “era
com satisfação que os barões feudais cortavam os narizes e os lábios dos turcos
que aprisionavam”[45].
O exército de bestas selvagens e bárbaros encolerizados estava mostrando sua
verdadeira face.
Terminada a chacina, os cruzados
tomaram conta de Antioquia e se tornaram sitiados por um exército muçulmano que
havia chegado tardiamente para o auxílio do povo antioqueno. Os cruzados já
estavam sem ânimo e sem recursos, já que os oito meses de cerco na cidade
também a haviam deixado sem suprimentos. Até que um acontecimento curioso
causou uma reviravolta no cenário: a santa lança. Um padre chamado Barthélemy
havia supostamente encontrado aquela que seria a mesma lança que o soldado
romano usou para perfurar o lado de Cristo na cruz. Essa fantástica e milagrosa
descoberta reforçou os ânimos dos cruzados, que partiram para cima dos
muçulmanos que cercavam a cidade, os quais partiram em retirada.
Tragicamente para o padre, o
legado pontifico não acreditou no suposto milagre. Depois de oito meses de
acirrados debates, mandaram o padre para o justíssimo “julgamento de Deus”, que Lins explica como funcionava:
Entre as várias modalidades de julgamento de Deus, eram muito usadas as
que consistiam em segurar ou pisar uma barra de ferro em brasa; meter o braço
numa caldeira d’água fervente; engolir um pedaço de pão ou de queijo, depois de
conjurado a ficar preso na garganta do paciente, caso fosse este culpado, etc.
Submetido o padre Pierre Barthélemy ao julgamento de Deus, que, no seu caso,
consistiu em atravessar, de pés descalços, uma fogueira, morreu de tremendas
queimaduras, ficando, destarte, evidenciada, com grande gáudio dos inimigos do
conde de Tolosa, a fraude do encontro da santa
lança, a qual, depois de despertar indescritível entusiasmo, operando o
milagre de uma vitória tida por impossível, caiu em tal descrédito que acabou
perdendo-se sem saber como...[46]
Assim, condenado ao julgamento
do fogo, morre o padre Barthélemy, e os cruzados perdem uma de suas milhares de
relíquias sagradas...
• Em Maara
Após a conquista de Antioquia,
com as mortes pela espada e principalmente pela fome, restaram apenas 20 mil
soldados de infantaria e 2 mil de cavalaria no exército cruzado[47].
A próxima etapa natural seria Jerusalém, mas antes disso “cada chefe cruzado empenhou-se em ações isoladas
procurando realizar uma conquista territorial para benefício próprio”[48].
A mais sangrenta, imoral e vergonhosa de todas foi a conquista de Maara, que
marcou um dos episódios mais lamentáveis e deploráveis das Cruzadas. Após
assinar um tratado de paz com os cidadãos da cidade, dando um salvo-conduto de
não-agressão em caso de rendição, os habitantes de Maara desgraçadamente
acreditam na palavra dos monstros morais e sofrem um massacre memorável:
Chega a noite de 11 de dezembro. Está
muito escuro e os francos ainda não ousam penetrar na cidade. Os notáveis de
Maara entram em contato com Boemundo, o novo senhor de Antioquia, que se
encontra à frente dos atacantes. O chefe franco promete garantias se cessarem o
combate, deixando para trás algumas construções. Agarrando-se desesperadamente
à sua palavra, as famílias reúnem-se nas casas e porões da cidade e, a noite
toda, esperam tremendo. Na alvorada, chegam os francos. É uma carnificina.
Durante três dias, eles matam mais de cem mil pessoas pela espada, e fazem
muitos prisioneiros.[49]
Poucos exércitos na história se
igualam em termos de monstruosidade ou ao menos são comparáveis neste quesito
ao exército cruzado. Instauraram um genocídio em uma cidade indefesa que já
havia se rendido, após terem prometido um salvo-conduto em caso de rendição.
Queimaram crianças de colo e mulheres vulneráveis após ter lhes prometido que
deixariam viver. O cronista franco Raoul de Caen, testemunha ocular dos
acontecimentos, escreveu que “os nossos faziam
ferver os pagãos adultos em caldeira, fincavam as crianças em espetos e as
devoravam grelhadas”[50].
E são esses monstros canalhas que são louvados hoje em dia pela apologética
católica e por outros cretinos.
Como se não bastasse o genocídio
covarde em Maara, os cruzados ainda praticaram canibalismo com os cadáveres dos
vencidos. Maalouf descreve os francos fanatizados, que “se
espalham pelos acampamentos, clamando bem alto que querem devorar a carne dos
sarracenos, e que se reúnem à noite ao redor do fogo para devorar suas presas”[51].
Baudri, o arcebispo de Dôle, defendia o canibalismo sob o argumento de que “comer cadáveres de infiéis é ainda fazer-lhes guerra”[52].
Lins declara que os cruzados devoraram cadáveres de muçulmanos “até mesmo já em estado de putrefação”[53].
O cronista franco Albert de Aix
iria dizer que “os nossos não repugnavam em comer
não só a carne dos turcos e dos sarracenos mortos como também a carne dos cães”[54].
Um capelão do conde de Tolosa, também testemunha ocular, escreveu que “chegaram os cruzados da classe popular a devorar, com
avidez, corpos de sarracenos decompostos e já fétidos, que se encontravam nos
pântanos, junto da cidade, desde quinze e mais dias”[55].
Por tudo isso, em toda a sua literatura épica, os francos seriam
invariavelmente descritos como antropófagos[56].
Paz a todos vocês que estão em Cristo.
- Extraído do meu livro: "Cruzadas - O Terrorismo Católico".
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[1]
DUCHÉ, Jean. Historia de la Humanidad II
– El Fuego de Dios. 1ª ed. Madrid: Ediciones Guadarrama, 1964, p. 377.
[2]
(INS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 314.
[3]
ibid.
[4]
BALLESTEROS, Manuel; ALBORG, Juan Luis. Historia
Universal Hasta el Siglo XIII. 4ª ed. Madrid: Editorial Gredos, S. A., 1967,
p. 430.
[5]
LINS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 313.
[6]
TORNELL, Ricardo Vera. Historia de la
Civilización – Tomo I. 1ª ed. Barcelona: Editorial Ramón Sopena, 1958, p.
590.
[7]
ROPER, Hugh Trevor. A Formação da Europa
Cristã. 1ª ed. Lisboa: Editorial Verbo, 1975, p. 112.
[8]
DUCHÉ, Jean. Historia de la Humanidad II
– El Fuego de Dios. 1ª ed. Madrid: Ediciones Guadarrama, 1964, p. 378.
[9]
VARA, Julián Donado; ARSUAGA, Ana Echevarría. La Edad Media: Siglos V-XII. 1ª ed. Madrid: Editorial universitaria
Ramón Areces, 2010, p. 303.
[10]
VALENTIN, Veit. História Universal – Tomo
II. 6ª ed. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1961, p. 10.
[11]
FRANCO, Hilário. As Cruzadas. 1ª ed.
São Paulo: Brasiliense, 1981, p. 36.
[12]
MICHAUD, Joseph François. História das
Cruzadas – Volume Primeiro. 1ª ed. São Paulo: Editora das Américas, 1956,
p. 167-168.
[13]
VALENTIN, Veit. História Universal – Tomo
II. 6ª ed. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1961, p. 253.
[14]
Godofredo de Villehardouin, The Conquest
of Constantinopla. Chronicles of the Crusades, tradução inglesa de M. R. B.
Shaw, Londres, 1963, pp. 58-59.
[15]
MICHAUD, Joseph François. História das
Cruzadas – Volume Primeiro. 1ª ed. São Paulo: Editora das Américas, 1956,
p. 175.
[16]
ibid.
[17]
ibid.
[18]
MICHAUD, Joseph François. História das
Cruzadas – Volume Primeiro. 1ª ed. São Paulo: Editora das Américas, 1956,
p. 171.
[19]
ibid.
[20]
ibid, p. 168-169.
[21]
RUNCIMAN, Steven. História das Cruzadas,
Volume II: O Reino de Jerusalém e o Oriente Franco, 1100-1187. 1ª ed. Rio
de Janeiro: Imago Ed., 2002, p. 28.
[22]
ibid.
[23]
MICHAUD, Joseph François. História das
Cruzadas – Volume Primeiro. 1ª ed. São Paulo: Editora das Américas, 1956,
p. 163-164.
[24]
ibid, p. 177.
[25]
ibid.
[26]
LINS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 314.
[27]
FRANCO, Hilário. As Cruzadas. 1ª ed.
São Paulo: Brasiliense, 1981, p. 42.
[28]
DUCHÉ, Jean. Historia de la Humanidad II – El Fuego de Dios. 1ª ed. Madrid:
Ediciones Guadarrama, 1964, p. 382.
[29]
MORRISSON, Cécile. Cruzadas. 1ª ed.
São Paulo: L&PM Pocket, 2009.
[30]
DUCHÉ, Jean. Historia de la Humanidad II
– El Fuego de Dios. 1ª ed. Madrid: Ediciones Guadarrama, 1964, p. 382.
[31]
DUCHÉ, Jean. Historia de la Humanidad II
– El Fuego de Dios. 1ª ed. Madrid: Ediciones Guadarrama, 1964, p. 382-383.
[32]
MAALOUF, Amin. As Cruzadas Vistas Pelos Árabes. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense,
2001, p. 48.
[33]
DUCHÉ, Jean. Historia de la Humanidad II
– El Fuego de Dios. 1ª ed. Madrid: Ediciones Guadarrama, 1964, p. 383.
[34]
ibid, p. 383.
[35]
Apud LINS, Ivan. A Idade Média – A
Cavalaria e as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p.
315.
[36]
Apud FRANCO, Hilário. As Cruzadas. 1ª
ed. São Paulo: Brasiliense, 1981, p. 40.
[37]
MICHAUD, Joseph François. História das
Cruzadas – Volume Segundo. São Paulo: Editora das Américas, 1956, p. 273.
[38]
BRENTANO, Les Croisades, p. 57-58.
Citado também em LINS, Ivan. A Idade
Média – A Cavalaria e as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana,
1944, p. 317.
[39]
Apud LINS, Ivan. A Idade Média – A
Cavalaria e as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p.
317.
[40]
LINS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 316.
[41]
ibid, p. 318.
[42]
ibid, p. 319.
[43]
MAALOUF, Amin. As Cruzadas Vistas Pelos
Árabes. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2001, p. 35.
[44]
ibid, p. 41.
[45]
BASTOS, Plínio. História do Mundo - Da
pré-história aos nossos dias. 3ª ed. Rio de Janeiro: Livraria Império, 1983,
p. 92.
[46]
LINS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 322.
[47]
TORNELL, Ricardo Vera. Historia de la
Civilización – Tomo I. 1ª ed. Barcelona: Editorial Ramón Sopena, 1958, p.
593.
[48]
FRANCO, Hilário. As Cruzadas. 1ª ed.
São Paulo: Brasiliense, 1981, p. 43.
[49]
MAALOUF, Amin. As Cruzadas Vistas Pelos
Árabes. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2001, p. 46.
[50]
Apud MAALOUF, Amin. As Cruzadas Vistas
Pelos Árabes. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2001, p. 47. Também citado em:
NAZARIO, Luiz. Autos-de-fé como
espetáculos de massa. São Paulo: Associação Editorial Humanitas: Fapesp,
2005, p. 39.
[51]
MAALOUF, Amin. As Cruzadas Vistas Pelos
Árabes. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2001, p. 47.
[52]
Apud LINS, Ivan. A Idade Média – A
Cavalaria e as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p.
317.
[53]
LINS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 322.
[54]
Apud MAALOUF, Amin. As Cruzadas Vistas
Pelos Árabes. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2001, p. 47.
[55]
Apud LINS, Ivan. A Idade Média – A
Cavalaria e as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p.
322-323.
[56]
MAALOUF, Amin. As Cruzadas Vistas Pelos
Árabes. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2001, p. 47.
Justino Martir que era do século II era a favor do batismo infantil?
ResponderExcluirNão existe batismo infantil em Justino.
ExcluirIrineu de Lião era a favor do batismo infantil?
ResponderExcluirTambém não há menções a batismo infantil em Irineu.
ExcluirImplicitamente, sim:
ExcluirIrenaeus
"He [Jesus] came to save all through himself; all, I say, who through him are reborn in God: infants, and children, and youths, and old men. Therefore he passed through every age, becoming an infant for infants, sanctifying infants; a child for children, sanctifying those who are of that age . . . [so that] he might be the perfect teacher in all things, perfect not only in respect to the setting forth of truth, perfect also in respect to relative age" (Against Heresies 2:22:4 [A.D. 189]).
Isso se você considerar que "renascer em Deus" se refere ao batismo, mas não há nenhuma evidência de que Irineu estivesse se referindo ao batismo aqui, e o evangelho faz clara diferenciação entre o "nascer de novo" e o batismo.
ExcluirLucas, eu te amoooooooooooooo
ResponderExcluirPoxa, nem um obrigado? Sequer um abraço? Você é bastante frio, hein.
ExcluirVocê fez de novo a mesma coisa. --'
Excluir=(
ExcluirLucas de onde que os catolicos fundamentam suas doutrinas de batismo infantil.
ResponderExcluirDe Pais da Igreja de data mais posterior, como Orígenes, Cipriano, Agostinho, etc. Leia sobre isso aqui:
Excluirhttp://heresiascatolicas.blogspot.com.br/2015/04/o-batismo-infantil-foi-praticado-pela.html
Lucas, você é dispensacionalista?
ResponderExcluirSou dispensacionalista progressivo, não dispensacionalista clássico.
ExcluirComo assim cara, me explica isso rs?
ExcluirVeja neste artigo:
Excluirhttp://www.projetoomega.com/estudo7.htm
Ignorando a pessoa que fala sobre, você poderia ver esse vídeo e me dizer o que acha?
ResponderExcluirhttps://www.youtube.com/watch?v=Qce77uIFwP0
Só ouvi verdades.
ExcluirAssisti pornografia de novo :( ore por mim, por favor
ResponderExcluirOrarei.
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