A Terceira Cruzada
A Terceira Cruzada é conhecida
como “A Cruzada dos Reis”, porque contou com a participação de Frederico
Barba-Ruiva (Sacro Império Romano-Germânico), Ricardo Coração de Leão
(Inglaterra) e Filipe Augusto (França). Como não poderia deixar de ser
diferente, começou com ataques aos judeus: “Felipe
Augusto da França fez prender os judeus em suas sinagogas e obrigou-os a
contribuir com cinco mil marcos de prata”[1].
Lins observa:
Manifestou-se, demais, de maneira
ruidosa, o entusiasmo dos ingleses por tremenda perseguição aos seus algozes,
suicidando-se. Em York, mataram-se, por suas próprias mãos, nada menos que
quinhentos. O chefe da família tomava de um punhal, e, depois de matar a esposa
e os filhos, suicidava-se, a fim de evitar os suplícios a que o povo,
exacerbado, submetia os israelitas – conta o abade Fleury, o qual registra
ainda haverem os cristãos queimado arquivos e papeis dos judeus para se
livrarem de suas dívidas[2].
Renovavam-se estas cenas de horror em cada cruzada. Como todos precisavam de
dinheiro para a santa expedição, lembravam-se de que os judeus, em geral
depositários de grandes riquezas, haviam crucificado o Deus dos cristãos.[3]
A jornada à Terra Santa terminou
mais cedo para o imperador do Sacro Império Romano-Germânico (que em realidade
não era nem “Sacro”, nem “Império”, nem “Romano”), que se afogou em um rio
cujas águas não chegavam à cintura. Alguns dizem que ele sofreu de um ataque
epilético; outros, que sua armadura pesada o impediu de se levantar quando
caiu. De qualquer forma, este foi o fim dos soldados do “Sacro” “Império”
“Romano” Germânico.
Embora o objetivo da Cruzada
fosse Jerusalém, Ricardo, o “Coração de Leão”, priorizou a conquista de ilhas e
territórios fora da Terra Santa, colocando em primeiro lugar as conquistas
pessoais, como já ocorrera na Primeira Cruzada. Sua obstinação por triunfos e
novas terras no Oriente era tão grande que ele tomou até a ilha de Chipre, que
era propriedade dos bizantinos e não dos muçulmanos[4].
Isso, por si só, já torna claro como o objetivo dos cruzados não tinha nada a
ver com uma briga pessoal com os muçulmanos ou com ajudar o imperador
bizantino. Qualquer território que servisse estava propício a ser conquistado,
não importava de quem fosse.
Além de Chipre, Ricardo também
investiu contra a cidade costeira de Acre (não o Acre que você está pensando),
onde cometeu mais um dos vários crimes de guerra dos cruzados. Prometendo
poupar seus cidadãos em caso de rendição, exterminou quase três mil
prisioneiros quando estes se renderam[5].
Normal para um exército que nunca aprendeu o significado de lealdade e honra.
Duché conta como foi o massacre:
Ricardo disse que queria ser pago
primeiro, e Saladino que queria ver sair, ao menos de longe, aos muçulmanos.
Então Ricardo, furioso, fez sair a três mil prisioneiros, nus e atados, e deu a
ordem que se degolassem à vista de Saladino “aqueles canalhas”. Saladino
distribuiu os cem mil dinars entre os oficiais, enviou a Verdadeira Cruz a
Bagdá, e deu graciosamente os cem cristãos a Ricardo.[6]
Franco diz que além da execução
dos três mil prisioneiros ainda abriram as suas entranhas e as reviraram em
busca de ouro que supostamente teriam engolido para escondê-lo[7]. Note
que, ao invés de Saladino devolver o massacre com outro massacre de
prisioneiros, ele generosamente devolveu cem cristãos a Ricardo, logo após este
massacrar os prisioneiros muçulmanos que possuía. Era essa a diferença entre um
militar e um selvagem. Sobre este episódio, Lins escreve:
Crueldade sem nome de Ricardo foi
fazer degolar os três mil reféns muçulmanos, entregues em consequência da
capitulação de Acre: barbaria inaudita, perpetrada de sangue frio, sem a
desculpa do ardor da refrega e tanto mais chocante quanto, ao adoecer Ricardo,
lhe enviara Saladino sorvetes e frutas que concorreram para restabelecê-lo. A
esses rasgos de generosidade, respondeu o rei da Inglaterra com uma
carnificina! Para honra da espécie humana, teve o sarraceno bastante domínio
sobre si mesmo, não retrucando a chacina dos prisioneiros muçulmanos com a
execução dos cristãos, muito mais numerosos, que se encontravam em seu poder.[8]
A misericórdia de Saladino era
tanta que ele libertava os prisioneiros cristãos, que mais tarde o traíam e se
voltavam contra ele:
Depois de guardar consigo, durante um
ano, o rei de Jerusalém, Guido de Lusignan, deu-lhe Saladino a liberdade,
fazendo-o jurar, sobre os Evangelhos, que não tornaria a pegar em armas contra
ele. O primeiro cuidado de Lusignan, logo que se viu em liberdade, foi,
todavia, como era de praxe entre os cristãos, obter, de uma junta de bispos, a
anulação de seu juramento, tudo empreendendo para reaver o perdido reino.[9]
Lins diz que “embora fossem inúmeras as demonstrações de crueldade
dadas pelo Coração de Leão, em quem por vezes, parecia haver-se encarnado
Renaud de Châtillon, não podiam os muçulmanos deixar de admirá-lo pela sua
temerária bravura, associada a fabulosa força física e excepcionais qualidades
militares, infelizmente desacompanhadas de qualquer senso político”[10].
Maalouf escreve:
Decidido a aproveitar o seu sucesso
para dirigir uma vasta ofensiva, não tem tempo para se ocupar dos cativos, atua
como o sultão, quatro anos antes, quando as cidades francas caíam em suas mãos
uma depois da outra. A única diferença é que, não querendo ficar com tantos
prisioneiros, Saladino os havia soltado, enquanto Ricardo prefere
exterminá-los. Dois mil e setecentos soldados da guarnição de Acre são reunidos
diante dos muros da cidade, com perto de trezentas mulheres e crianças de suas
famílias. Atados por cordas formando uma só massa de carne, são entregues aos
combatentes francos, que encarniçam sobre eles com seus sabres, lanças e
pedras, até que os gemidos se calem.[11]
Mas nada disso se compara aos
massacres que os francos comandados pelo rei da Inglaterra fizeram aos
muçulmanos do Acre depois de terem
prometido a vida salva aos habitantes da cidade em caso de rendição. Mais uma
vez, os francos traem os muçulmanos em seus acordos e realizam uma grande
carnificina:
“Desistindo de obter socorro, o
governador egípcio pede a vida salva para ele e para os habitantes da cidade”,
diz Ibn al-Qalanissi. Balduíno promete-lhes que serão liberados. Mas assim que
os muçulmanos saem da cidade, carregando seus bens, os francos se jogam sobre
eles, despojam-nos e matam grande número deles.[12]
Maalouf diz que “no espaço de dezessete meses, Tripoli, Beirute e Saida,
três das cidades mais renomadas do mundo árabe, foram tomadas e saqueadas, seus
habitantes massacrados ou deportados, seus emires, seus cádis, seus homens da
lei mortos ou forçados ao exílio, suas mesquitas profanadas”[13].
E em meio a essas conquistas, prostitutas eram trazidas do Ocidente para
realização de orgias com os cruzados, como já era costume desde a Primeira
Cruzada até a última:
Entretanto, a miséria, que tão
frequentemente assolava os cruzados, não impedia que muitos se entregassem a
todos os excessos da licenciosidade e da orgia. Viam-se reunidos, sob o
estandarte da cruz, todos os vícios da Europa e da Ásia. Se se der crédito a um
historiador árabe, no próprio momento em que os francos lutavam com a fome e as
doenças contagiosas, chegaram-lhes ao acampamento trezentas mulheres vindas do
Ocidente, que se entregavam aos soldados, sem terem necessidade, para
seduzi-los, de empregar os encantamentos da Armida do Tasso.[14]
Roper diz que “a Cruzada terminou no meio da recriminação geral. O
imperador afogou-se num rio da Armênia; o rei da França regressou a casa com o
fim de vingar o rei da Inglaterra, seu aliado na Europa; e o monarca inglês
ficou a admirar e imitar alternadamente a bravura do seu adversário muçulmano,
que continuava firmemente no comando de Jerusalém”[15].
Ricardo, vendo que o rei da França havia retornado para tomar suas terras na
Europa, foi obrigado a retornar também, assinando antes um tratado com Saladino
no qual este “reconhecia a posse do literal
sírio-palestino aos ocidentais e permitia aos cristãos peregrinarem a
Jerusalém, que continuava contudo sob seu domínio”[16].
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[1]
LINS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 365.
[2] Abade FLEURY, Histoire Ecclésiastique, vol. IV, p. 785.
[3]
LINS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 366.
[4]
BALLESTEROS, Manuel; ALBORG, Juan Luis. Historia
Universal Hasta el Siglo XIII. 4ª ed. Madrid: Editorial Gredos, S. A., 1967,
p. 434.
[5]
CLIFF, Nigel. Guerra Santa. São
Paulo: Editora Globo, 2012.
[6]
DUCHÉ, Jean. Historia de la Humanidad II
– El Fuego de Dios. 1ª ed. Madrid: Ediciones Guadarrama, 1964, p. 407;
[7]
FRANCO, Hilário. As Cruzadas. 1ª ed.
São Paulo: Brasiliense, 1981, p. 80.
[8]
LINS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 377.
[9]
ibid, p. 370-371.
[10]
ibid, p. 377.
[11]
MAALOUF, Amin. As Cruzadas Vistas Pelos
Árabes. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2001, p. 197.
[12]
ibid, p. 72.
[13]
ibid, p. 84.
[14]
LINS, Ivan. A Idade Média – A Cavalaria e
as Cruzadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Pan-Americana, 1944, p. 374.
[15]
ROPER, Hugh Trevor. A Formação da Europa
Cristã. 1ª ed. Lisboa: Editorial Verbo, 1975, p. 115.
[16]
FRANCO, Hilário. As Cruzadas. 1ª ed.
São Paulo: Brasiliense, 1981, p. 50.
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